Empresarial

Igualdade salarial: como estabelecer uma política eficaz em sua organização

Um estudo conduzido por pesquisadores das universidades de Kellogg, Rutgers e Carolina do Norte revela que gerentes em posições de poder são menos propensos a perceber desigualdades salariais e de gênero em suas próprias organizações, devido à forte identificação com a empresa e à conexão entre sua autoestima e a visão positiva que mantêm da instituição.Apesar do aumento das iniciativas de diversidade, equidade e inclusão (DEI) no setor empresarial, estima-se que até 2030, o mercado global para esses programas mais que dobrará, atingindo a marca de US$ 24 bilhões. Contudo, a implementação dessas iniciativas frequentemente esbarra na resistência de gerentes que, embora reconheçam a existência generalizada da desigualdade, acreditam que essa não se manifesta em suas próprias organizações.

A desigualdade salarial de gênero e racial continua sendo um desafio significativo no ambiente corporativo global. No entanto, mesmo em empresas renomadas como a Salesforce, liderada por Marc Benioff, a percepção dessa disparidade pode ser notavelmente distorcida entre os executivos. Em recente entrevista ao programa 60 Minutes, Benioff desmentiu alegações de pagamento desigual na Salesforce, afirmando: “isso não é possível. Nossa cultura é excelente. Somos considerados o ‘melhor lugar para trabalhar’. Aqui não há falcatruas quando se trata de pagar as pessoas — não há desigualdade salarial.”

A psicologia por trás da negação

Pesquisas anteriores atribuíram essa negação à predominância de gerentes pertencentes a grupos demográficos majoritários, como brancos ou homens, ou a uma visão conservadora que resiste às mudanças propostas pelas iniciativas de DEI. Contudo,, professora de Administração e Organizações na Kellogg School of Management, Maryam Kouchaki, propõe uma visão mais aprofundada. Em colaboração com Christopher To, da Rutgers University, e Elad Sherf, da Universidade da Carolina do Norte, Kouchaki descobriu que os gerentes frequentemente não percebem a desigualdade salarial em suas próprias empresas porque sua autoestima está intimamente ligada à visão positiva que mantêm sobre a organização.

Identificação organizacional e cegueira às desigualdades

A pesquisa conduzida por Kouchaki revela que a identificação com a organização pode obscurecer a percepção de desigualdades internas, afirmando que “a desigualdade está em todos os lugares”..

“Mas as pessoas em cargos de poder têm um senso de propriedade sobre a organização e não conseguem perceber essa desigualdade dentro de seu próprio contexto.” Essa identificação organizacional leva os gerentes a manterem uma visão positiva da empresa e de si mesmos, impedindo-os de reconhecer problemas como a desigualdade salarial internamente, mesmo que consigam identificar tais questões em outras organizações.

Estudos e evidências empíricas

Para validar essa hipótese, a equipe de pesquisa analisou dados de sete pesquisas realizadas entre 1993 e 2016, envolvendo mais de 60 mil participantes do governo federal dos EUA. Os resultados indicaram que os supervisores tendem a relatar menos desigualdade em suas próprias organizações em comparação com seus pares não gerentes. Em uma amostra adicional de quase mil participantes, os gerentes relataram 13% menos desigualdade em suas organizações do que os não gerentes, apesar de reconhecerem igualmente a desigualdade em outras empresas.

Impacto nas decisões de alocação de recursos

Além da percepção distorcida, essa cegueira organizacional afeta diretamente as decisões estratégicas, como a alocação de orçamento para iniciativas de diversidade. Em um estudo envolvendo mais de 350 participantes, gerentes demonstraram 19% menos apoio a programas de diversidade comparados a não gerentes. Essa tendência pode resultar em desinvestimentos críticos em áreas que necessitam de atenção para promover um ambiente de trabalho mais equitativo.

Estratégias para superar o viés gerencial

Felizmente, a pesquisa indica que é possível mitigar esse viés. Em um experimento envolvendo mais de 700 participantes, aqueles que foram solicitados a recordar situações de desigualdade em seu local de trabalho alocaram 30% mais fundos para iniciativas de diversidade do que aqueles que não passaram por esse exercício. “A exposição à ideia de desigualdade em seu próprio local de trabalho reduziu imediatamente o preconceito”, explica Kouchaki. Esse insight é exemplificado pela mudança de postura de Marc Benioff, que, ao ser confrontado com dados reais sobre desigualdade salarial na Salesforce, destinou milhões de dólares para corrigir o problema.

Recomendações para gerentes e líderes corporativos

Para que as empresas avancem em direção a uma verdadeira equidade salarial, é crucial que os gerentes adotem uma postura proativa na identificação e combate às desigualdades internas. Kouchaki aconselha: “Gerentes devem ativamente buscar processos que possam estar perpetuando desigualdades. O salário pode ser igual para homens e mulheres, mas talvez os bônus não. É essencial estar comprometido com a coleta de informações sobre possíveis desigualdades e agir de acordo.”

A resistência interna à percepção de desigualdade salarial, especialmente entre aqueles em posições de poder, representa um obstáculo significativo para a implementação eficaz de iniciativas de diversidade e inclusão. No entanto, com abordagens conscientes e baseadas em evidências, como as sugeridas por Kouchaki e sua equipe, é possível transformar a cultura organizacional e promover um ambiente de trabalho verdadeiramente equitativo. A experiência da Salesforce serve como um lembrete de que a conscientização e a disposição para enfrentar dados desconfortáveis são passos fundamentais para a mudança positiva nas empresas.

Com informações Revista Exame

 

Fonte: Portal Contábeis